A HISTÓRIA DO CÃO BOB

Eu morava na rua Chile, número cento e quatorze na cidade de Pindamonhangaba no ano de 2003. Decidi que seria bom se eu tivesse um cão para vigiar a casa. Eu sempre gostei muito de animais e principalmente de cachorros e sempre quis ter um cão da raça Pastor Alemão. Estava agora a oportunidade e a necessidade. Comecei a procurar um cão assim para mim.
Andando pela cidade, passei pelo mercado municipal de Pindamonhagaba e vi um anúncio na parede que dizia; “Vendo Pastor Alemão”. Anotei o telefone e depois entrei em contato com o anunciante. Marcamos para nos encontrar na rua Uruguay no distrito municipal de Moreira César há uns dez kilômentros da cidade de Pindamonhagaba. Quando cheguei ao endereço, vi uns três cães, dois na cor preta e outro na cor meio amarela e meio preta, parecendo um filhote de pastor, no entanto, de antemão eu percebi que eram cães mestiços à pastores alemães. O valor que Rogério, dono dos cães me pediu pelo cão, era de se esperar que não fosse mesmo um cão com pedigree. Mesmo sendo mestiço, o que mais me atraiu fora que o cão amarelado e preto era o que mais brincava comigo. Decidi naquela hora que não iria embora sem ele. Paguei o agora ex dono do cão e colocara-o dentro de meu carro e fomos rumo ao meu trailer de lanche, pois, era horário em que eu estava trabalhando e apenas saí para ver e possivelmente trazer o cão. Então, o cão que eu acabara de comprar e que tinha o nome de Krife, chamava-se agora Bob.
Sempre fui apaixonado pelo Bob desde o primeiro momento que o vi. Era um cão muito inteligente e muito ligado comigo. Caminhávamos praticamente todos os dias. Íamos até o viaduto que passava pela rodovia presidente Dutra que era um tanto próxima de onde eu morava. No início ele estranhou um pouco, mas, rapidamente se adaptou. Naquela época em que eu morei em Pindamonhagaba, aliás, uma das épocas mais difíceis de minha vida, o Bob foi o “ser” que mais esteve presente. Eu que sempre fui de poucos amigos e ao mesmo tempo o cão realmente se mostra mais amigo do homem do que o próprio homem, então ele realmente era um parceirão.
Bob provavelmente era o menor de sua cria, pois, foi o último a ser vendido e não ficou muito grande, mesmo com muitas vitaminas e boas rações que eu lhe dava, no entanto, era um dos cães mais inteligentes que conheci na vida. Era praticamente um telepata. Sabia o que eu pensava, mesmo que estava a uma certa distância dele. Ele lia perfeitamente minhas expressões e sabia o que eu estava dizendo ou pensando. Quando eu pensava em sair pra caminhar com ele, já estava o Bob a gritar e a pular de alegria. Acho que pra ele, caminhar comigo fazia ele ter a mesma sensação que um homem comum tem ao ganhar um prêmio milionário na loteria. Era tanta euforia que eu tinha dificuldades de colocar a coleira nele e segurá-lo no início. Era muita felicidade mesmo.
Uma vez o Bob teve um sangramento espontâneo e ficamos preocupado. Neste dia chovia muito e minha casa em Pinda era pequena e não tinha nenhuma cobertura no quintal. Colocamos o Bob para dormir dentro de casa. Impressionante como ele aceitou o convite e se manteve comportado. Não saia do canto da sala/quarto que arrumamos para ele e ficava me olhando como que me observando e agradecendo por deixá-lo ficar ali naquela noite. Durante toda a noite ele ficou no seu cantinho sem fazer nenhum barulho, mesmo quando a Cherry, uma Pincher muito irritada, ficava rosnando pra ele, porque estava dentro da “casa dela”. Creio que ela pensava que ele estar ali dentro era um absurdo, inadmissível, ele deveria estar no quintal.
Depois de quase dois anos em Pindamonhagaba, voltei para Cruzeiro, minha cidade natal. O Bob rapidamente fez as pazes com os cães que já moravam em minha casa em Cruzeiro. Continuávamos a caminhar quase todos os dias e ele era muito mais feliz aqui porque agora ele ficava no quintal da casa de minha mãe que era nos fundos de minha casa e tinha contato com muitas pessoas. Como ele sempre foi muito sociável, ele gostava muito daquela movimentação.
Volta e meia ele ficava mal, tinha diarreia, ficava um tanto quieto e uma vez ele ficou muito doente e só sobreviveu porque medicamo-lo e forçamos-o a comer, enfiando comida a goela abaixo. Depois ficou bom novamente. Percebi então, que mesmo que tivéssemos um certo cuidado com o Bob, ele era meio problemático e poderia adoecer-se facilmente.
Eu saia de casa as 8 horas da manhã e chegava da empresa depois das 22 horas todos os dias, de domingo a domingo. Era época de vacinação do Bob e eu pedi para levá-lo e não me deram importância. Pedi por várias vezes e me diziam que não dava tempo. Então, liguei para o veterinário e marquei por volta das 17:30 horas para ele me esperar em sua clínica, que eu sairia temporariamente da empresa e levaria o Bob. Dado meia hora antes do horário peguei a bicicleta e o Bob, e fui puxando-o para dar tempo de chegarmos no horário combinado. O Bob não corria muito e embora ele fosse meio problemático, era um tremendo atleta. Mas, este dia percebi que ele não corria como antes, mas, pensei que apenas estava destreinado por não estarmos caminhando mais como antes e segui em frente. Ao chegar na clínica o Bob estava muito cansado, no entanto, o objetivo maior que era tomar a vacina estava sendo alcançado. Depois de uns 10 minutos o veterinário que já havia ido embora para casa voltou para vacinar o Bob. Depois de vacinado, o Bob não parou de sangrar e o veterinário ofereceu para levá-lo para casa em seu carro que era apropriado para carregar animais, pois, o Bob estava sangrando bastante pelo simples furo de agulha. Achei que era devido a agitação dele por ter corrido tanto. Portanto, depois que chegou em casa o Bob continuou a sangrar e chamamos o veterinário novamente para vê-lo. Apenas depois de algumas horas o Bob parou de sangrar. Eu não havia percebido naquele dia, mas, já era uma deficiência que ele estava apresentando. Porém, sem muitas complicações, o sangramento parou posteriormente e o Bob aparentava estar bem.
Noutro dia levei-o novamente ao veterinário e agora fora diagnosticado erliquiose. Começamos a medicá-lo, mas, eu não acompanhava muito o tratamento por pouco ficar em casa e pedi para que cuidasse dele pra mim.
Eu chegava da empresa depois das 22 horas todos os dias. Eu entrava pelos fundos de casa e um dia quando cheguei para ver o Bob, pois pouco nos víamos porque não estávamos mais caminhando por não sobrar tempo, percebi que um dos olhos dele estava com uma cor diferenciada. Comentei sobre o ocorrido e pedi para que o levasse no veterinário novamente e investigasse melhor o que ele tinha porque eu saia as 8 horas da manhã e só voltaria depois das 22 horas e não daria para eu levá-lo. Os dias foram passando e não deram importância e nem o levara. Como eu já havia levado o Bob ao veterinário várias vezes e parecia que pouco resolvia, como autodidata que sempre fui, confiante em alguns profissionais, mas, sem desprezar meu discernimento, comecei a pesquisar pela internet sobre a doença do Bob, sobre a erliquiose e suas conseqüências e sobre o que poderia ser a opacidade que inchava e tomava o seu olho direito. Como o olho dele começou inchar demais parecendo que iria explodir, pedi para que o levasse rapidamente a um veterinário para averiguar o que ocorria. Como de costume, não me deram importância. Como eu chegava apenas no final da noite em casa, eu tinha uma visão progressiva do quadro do Bob bem articulada e ninguém fazia nada, inclusive eu. Então, comecei a ficar com um certo remorso, pois, o maior amigo que tive em toda minha vida e quem mais me amou, estava agora precisando de ajuda e eu pedia para os outros que não faziam nada e nem tampouco se importavam.
Depois de ter travado uma tremenda discussão em um fórum na internet, percebi que deveria procurar uma clínica veterinária especializada e sem saber muito bem o que fazer, procurei um conceituado veterinário na cidade de Cruzeiro e ele me indicou uma clínica especializada na cidade de Pindamonhangaba chamada Clínica Veterinária Sassaki. Naquele mesmo dia liguei e marquei para levá-lo. Fechei a empresa sem olhar para trás e coloquei o Bob no carro e rumei para a clínica Sassaki. Chegando na clínica eu estava um tanto nervoso com toda a situação em que eu estava vivendo naquele momento e que ponto estavam as coisas em minha vida e a apatia e mediocredade dos que estavam ao meu redor. Logo fui chamado para entrar na sala 3 da clínica. Lá estava o médico veterinário Mário Sassaki. Como eu estava ansioso e um tanto nervoso, ele que já é um tanto afobado ficara ainda mais e esforcei ao máximo para dizer à ele que eu estava calmo e sem pressa alguma e ele podia fazer o trabalho dele sem qualquer preocupação. Embora o Bob estava muito bem aparentemente, o médico rapidamente alertou-nos que ele não estava bem e de maneira extremamente educada, delicada e sutil, disse-nos que o Bob poderia morrer a qualquer instante. Eu sabia que isso era possível até porque para morrer, basta estar vivo, no entanto, o comportamento do Bob era muito normal, apesar de estar com os olhos imensos de inchaço, e não parecia tão grave.
O Bob fora diagnosticado novamente com erliquiose e recomeçamos um tratamento. Fomos pra casa. Neste momento de tratamento eu havia voltado para empresa porque me ausentei apenas para levar o cão ao médico.
Fomos procedendo com o tratamento e o tempo foi passando. Voltamos algumas vezes na clínica Sassaki para algumas consultas, no entanto, a situação do Bob não era boa e ele estava piorando. Neste tempo, tive muitos problemas familiares.
Passado uns 3 meses da primeira consulta de Bob na clínica Sassaki, Bob não estava nada bem. Cansado, desanimado, apenas com amor no olhar, como sempre.
A saúde de meu cão estava completamente comprometida e nada mais eu podia fazer. Tudo que me era possível, inclusive em termos financeiros, havia feito. Mas, de nada mais adiantava naquela altura. A situação se agravou. Então, conforme o avançar do quadro, sem mais meios para buscar, na manhã fatídica de 7 de setembro de 2009, Bob veio a falecer após 20 dias de uma transfusão de sangue sem sucesso. Foi muito triste seu fim (ou retorno). Ele foi meu melhor amigo, um dos meus maiores mestres e pouco pude fazer por ele. Reconheço que não fiz tudo que deveria por ele e alerto a todos para não caírem no mesmo erro que eu, no entanto, fiz o máximo que pude naquela época, naquele momento. Fiquei muito triste com o falecer do Bob e com a indiferença de todos, portanto, tenho esperança que um dia os animais poderão ser tratados e reconhecidos com dignidade, como todos nós gostamos de ser tratados e reconhecidos.
O mundo ainda há de evoluir muito e todos evoluirão. Não tenho dúvida disso. Cada coisa no seu tempo. Um dia todas as pessoas saberão definir com mais clareza e maior discernimento, quem é o seu próximo.


Carta de agradecimento.

Olá a todos. Primeiramente quero agradecer a todos, sem exceção, de ajudar-me a encontrar um “diagnóstico”, prognóstico ou solução do problema em questão, ou seja lá qual for o termo mais correto. Depois de “minha” experiência adquirida em meus 28 anos de vida, principalmente nestes últimos dias e principalmente nas últimas horas do dia 25/04/2009, levo-me a crer, que o termo da palavra COMPETÊNCIA, não faz mais sentido pra mim. Se eu tivesse que definir competência para o profissional, ou melhor, para o “homem” que conheci e que estava na posição assumida de médico veterinário, na Clínica Veterinária Sassaki em Pindamonhangaba. Eu, Halan Crystian, na posição assumida, a qual representa uma pessoa jurídica, com compromisso e responsabilidade para com a comunidade empresarial e para com o Estado Federativo e principalmente com a sociedade em âmbito nacional e que mantém “honrado” este compromisso por dez anos, teria eu, necessariamente ter de definir-me como INCOMPETENTE. Pois o “homem” que conheci na posição assumida de veterinário, mas, que ao mesmo tempo parecia ser vários profissionais em um só e levando em conta que estes vários “profissionais” que eu citaria como médico de homens e de alma, psicólogo, psiquiatra, psicanalista, recepcionista, professor, entre outros tantos que eu seria incapaz de identificar. Sem pretensão, intenção, falsa modéstia ou demagogia, mas, como aprendizado para todos os homens, em “minha” ótica, muito dos médicos, psiquiatras e até professores Doutores que conheci, comparar o Médico Veterinário com estes que foram citados, seria o mesmo que dizer que um camelo passaria por uma agulha. Então, levo-me a crer que talvez o melhor termo para a palavra competência, seria simplesmente; compromisso no posto assumido no sentido mais amplo e compreensível desta palavra. Compromisso que é assumido por pessoas e que percebi ao sair da “clínica” é assumido por muitas pessoas em todas as “áreas da vida”, como internautas, pai, mãe, filho, marido, esposa, amigo, irmão, balconistas de padaria, policiais, donas de casa, atendentes de supermercados e de farmácias e por pessoas que se disfarçam de “malucos” e até mesmo “anjos” disfarçados de pessoas. No entanto, estão dispostos a cumprir o posto assumido. E mesmo ao sair desta “clínica” encontrei pessoas que ao invés de dizer incompetentes, diria eu agora, que são apenas pessoas inconscientes de seu papel na vida e no universo, no tempo e no espaço, independente de que seja de “boa intenção”. Consideremos ainda, que tudo tem seu tempo. Porém, para definir o “homem” que conheci como Mário Sassaki, talvez o termo mais adequado, seria simplesmente a pessoa autoconsciente de “ser” Humano, também no sentido mais elevado e compreensível que uma mente humana psíquica possa compreender.

Ao Médico Veterinário Mário Sassaki, meu eterno agradecimento pelo seu compromisso assumido comigo e também para com a sociedade e a todos àqueles que estão dispostos a assumirem o seu papel com responsabilidade e autoconsciência.
Halan Crystian e;
Seu cão Bob.